O sonho de Carlos Ghosn é o carro elétrico

O franco-brasileiro Carlos Ghosn, presidente mundial das montadoras Renault e Nissan, apostou a carreira num projeto que atrai mais concorrentes do que consumidores — o carro elétrico. O que falta para seu plano dar certo?

Carlos Ghosn, presidente da Renault e da Nissan: ele investiu 5 bilhões de dólares para popularizar os carros elétricos
A carreira do franco-brasileiro Carlos Ghosn, presidente mundial do grupo formado pelas montadoras Renault e Nissan, não foi mais a mesma depois de sua participação no Salão do Automóvel de Frankfurt, em setembro de 2009. Como de costume, a nata da indústria automobilística estava reunida para apresentar suas novidades.

Junto com os carrões da vez, boa parte das montadoras apresentou protótipos de veículos elétricos que, imaginava-se, seriam o futuro da indústria. Como o preço do petróleo havia batido recordes no ano anterior e as discussões sobre a crise ambiental ocupavam as manchetes dos jornais, parecia fazer sentido.

Ao contrário de seus colegas, Ghosn não se limitou a apresentar alguns projetos de longuíssimo prazo. Ele levou jornalistas e clientes para passear em quatro modelos elétricos e disse que havia destacado 2 000 engenheiros para lançar os veículos em até dois anos. De acordo com ele, até 2020, 20% do faturamento global do grupo viria de veículos abastecidos na tomada.

“É uma revolução da indústria automobilística chefiada por nós”, disse na época. Ghosn apostou sua reputação em uma tecnologia coberta de incertezas. Passados quatro anos, é impossível dizer se Ghosn, o executivo mais poderoso da indústria automotiva mundial, está cometendo o maior erro de sua carreira — ou se vai acertar de maneira espetacular.

O que se sabe, porém, é que a cada dia que passa sua meta inicial fica mais distante. Nissan e Renault já investiram 5 bilhões de dólares no desenvolvimento de carros elétricos — mais do que suas principais concorrentes somadas. Mas em dois anos e meio de produção venderam pouco mais de 100 000 unidades de seus cinco modelos elétricos.

O mais comercializado é o  compacto Leaf, da Nissan, com 71 000 unidades. Numa conta simples, em que se divide o investimento total pelo número de carros produzidos, cada modelo custou 55 000 dólares para chegar às ruas — e foi vendido por 30 000 dólares. No mesmo período, a Nissan e a Renault comercializaram mais de 16 milhões de carros tradicionais.

Se tivesse investido essa dinheirama toda para desenvolver novos carros a combustão, Ghosn poderia ter lançado oito modelos no período, todos prontos para o consumo de massa.

Um executivo preocupado com seu bônus de fim do ano não teria dúvida em investir em veículos a gasolina. Mas Ghosn está longe de ser um executivo tradicional. Filho de pai libanês e mãe francesa, ele nasceu em Rondônia e, ainda criança, se mudou com a família para o Líbano.

Fez faculdade de engenharia na França e passou os primeiros 18 anos de carreira na fabricante de pneus Michelin, onde chegou à presidência da subsidiária americana. Em 1999, assumiu a presidência da Nissan, montadora japonesa comprada pela Renault. Na época, a empresa tinha 5,4 bilhões de dólares em dívidas e suas fábricas produziam metade do que podiam.

Ghosn fechou cinco fábricas, demitiu milhares de trabalhadores e, em pouco tempo, devolveu a empresa ao prumo. Foi um choque no Japão, um país onde demitir era tabu. Mas foi o suficiente para que virasse uma celebridade e ganhasse o apelido de Samurai. Acabou acumulando a presidência da Renault em 2005 e virou o primeiro executivo da história a liderar simultaneamente duas das 500 maiores empresas do mundo.

Para dar conta, Ghosn desenvolveu uma disciplina militar. Passa três semanas por mês na França e uma no Japão. Suas reuniões duram no máximo 1 hora e 30 minutos — terminado o tempo, ele se levanta e parte para a próxima. Seu senso de urgência ajudou o grupo a sobreviver à crise de 2009.

Ghosn fechou fábricas na Europa e direcionou os investimentos para mercados emergentes. Em três anos, a Europa passou de 70% para 50% das vendas da empresa — o que ajudou as montadoras a crescer 30% desde 2010.

É essa reputação que Ghosn colocou na mesa. Por enquanto, ele não se abala com a apatia dos resultados. “Não é uma estratégia de curto prazo. É uma nova tecnologia, e não temos motivos para nos decepcionar com os resultados. As pessoas ainda estão se acostumando”, disse Ghosn a EXAME.

Para popularizar a tecnologia, ele apela para a consciência e para o bolso dos consumidores. “A dependência do petróleo e o aumento da emissão de gás carbônico fazem parte de uma realidade que não vai mudar se nada for feito.” Atualmente, 15% da emissão global de gás carbônico vem dos veículos a combustão — e os governos de países ricos estão pressionando as montadoras para reduzir esses índices.

Na França, veículos poluentes pagam 200 euros de taxa ao ano. Já os carros “verdes” ganham um subsídio de 700 euros na hora da compra. Há iniciativas semelhantes nos Estados Unidos, na Alemanha e no Japão. O que aumenta o otimismo de executivos como Ghosn é o fato de que abastecer veículos elétricos sai mais barato. Rodar com um carro elétrico custa 12% do que se pagaria com gasolina.

Uma pesquisa da consultoria PwC projeta que em 2020 um em cada 16 novos carros vendidos no mundo será elétrico ou híbrido (que tem dois motores, um elétrico e outro a combustão).

Veja mais em: EXAME.com

Nenhum comentário:

Veja Também